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Ata DTEC: Automação Jurídica e Geral.


Grupo de Estudos em Direito e Tecnologia da Universidade Federal de Minas Gerais- DTEC-UFMG

Data: 06/10/2020

Relatores: Arthur Salles de Paula Moreira, Gabriela Brandão Arrouk de Oliveira; Matheus Gomes Martins Coelho.

I. Os vieses e heurísticas em decisões judiciais: IA como alternativa?

O estudo dos processos de tomada de decisões foi vasto nas últimas décadas. Hebert Simon, no final da década de 1940, começou a desenvolver a ideia de racionalidade limitada, a partir da incorporação de desenvolvimentos da psicologia. A ideia central pode ser sintetizada pelo rompimento da afirmação clássica de que o homem escolhe e toma decisões baseadas na lógica e na sua racionalidade pura e simples.

A partir dos estudos de Daniel Kahneman e Amos Tversky, desde os anos 1970, a abordagem foi denominada de "heurísticas e vieses". Kahneman indica existirem dois sistemas cognitivos concorrentes que modelam o processo como são geradas crenças e os processos de tomada de decisões. Em suma, são identificados dois sistemas distintos: um rápido, intuitivo e emocional (que pode incidir em vícios e vieses[1]); o outro, mais lento, deliberativo e lógico.

À luz das principais teorias acerca da tomada de decisões, também não estariam os juízes, advogados e demais operadores do Direito permeadas por esses vieses cognitivos, podendo destoar da racionalidade desejada? Os estudos de Daniel L. Chen demonstram que sim: os magistrados nem sempre decidem com base exclusivamente na lógica e racionalidade.

A questão que se coloca a partir daí é: de que forma novas tecnologias como Inteligência Artificial (IA) pretendem contribuir para a tomada de decisões mais céleres, justas e racionais no campo do Direito?

II. Inteligência artificial aplicada ao Direito: o futuro da advocacia

A partir dos avanços tecnológicos recentes, é necessário repensar a forma como a prestação da atividade jurisdicional será desempenhada e qual a parcela de contribuição da IA nesse processo.

Sendo aplicada nas mais variadas áreas do conhecimento, a AI também vem sendo utilizada na prestação dos serviços jurídicos. Conforme aponta Anthony E. Davis, existem as seguintes áreas primárias em que a IA já é aplicada ao Direito, a saber:

1) Document Discovery: Apontado como o primeiro uso para IA no Direito e é bastante difundido. Em essência, é um software que permite que muitos documentos sejam pesquisados e identificados os que forem relevantes para os critérios de pesquisa. Geralmente é mais preciso do que as equipes de advogados ou assistentes jurídicos;


2) Expertise Automation: Trata-se, em essência, da reunião do conhecimento jurídico que permite aos clientes (assim como aos advogados) encontrar respostas para perguntas utilizando software desenvolvido para determinadas áreas jurídicas que antes teriam exigido interação com um advogado. Exemplos: elaboração de testamento, consultoria no direito do trabalho (quais os direitos trabalhistas específicos de uma funcionária grávida?). Além disso, esse é o campo de software cada vez mais desenvolvido para aumentar o acesso à justiça para indivíduos que não têm recursos para acessar um advogado.


3) Legal research. Softwares que permitem que clientes (ou advogados) façam pesquisas rápidas e precisas (e, portanto, baratas) que levariam muito mais tempo para serem realizadas por advogados (o que seria, portanto, mais caro, e provavelmente menos preciso).


4) Document Management. Muitas vezes, as corporações têm milhares ou dezenas de milhares de documentos semelhantes, como contratos, que precisam ser gerenciados até mesmo para a sua própria execução.


5) Contract and Litigation Document Analytics – and Contract and Litigation Document Generation. Existem agora inúmeros fornecedores de ferramentas de IA para ajudar os advogados a elaborar documentos consistentes, apropriados e atualizados, tanto nas esferas transacional quanto em litígios, por referência a enormes bancos de dados de precedentes. Além disso, existem formas de kits de ferramentas "faça você mesmo" para escritórios de advocacia e corporações para criar seus próprios programas de análise personalizados para suas necessidades específicas

A profusão de ferramentas de IA no mercado importará no fim da advocacia? Não. Mas a forma de atuação dos advogados poderá ser alterada substancialmente.

As mudanças serão focadas principalmente nas áreas de: formação e qualificação das futuras gerações de advogados (e onde esse treinamento acontecerá); a composição e estrutura dos escritórios de advocacia; e a economia dos escritórios de advocacia. Os advogados do futuro fornecerão quatro tipos básicos de serviço que a IA não pode fornecer até o momento, a saber: julgamento; empatia; criatividade e adaptabilidade.

III. A automação jurídica: exemplos de ferramentas já disponíveis

Looplex

Automatização de petições e criação de contratos. Para Advocacia em geral.


Netlex

Automatização da coleta e do processamento de informações, como revisão de contratos e pareceres, controle de prazos e acompanhamento processual. Para Advocacia em geral.


Lawtech Linte

Sistematização, armazenamento dos dados e insights e analytics. Para Advocacia em geral.


Justto

Utiliza Machine Learning e IA para verificar chances de êxito e hipótese de realização de acordo. Para Advocacia em geral.


LDSOFT

Executa rotinas gerenciais automaticamente através das informações disponibilizadas pelo INPI e dos despachos de processos contencioso através dos tribunais de justiça e diário oficial. Para Advocacia em geral.


PÔTI

Execução fiscal e penhora de bens. Comparando sua efetividade com atividades de um humano, o robô efetua um bloqueio a cada 35 segundos, enquanto um servidor realiza 300 durante todo o mês. Para o TJRN.


ELIS

Triagem de processos de execução fiscal, que totalizam 53% de todas as ações que estão em trâmite em Pernambuco. Enquanto a triagem manual de 70 mil processos leva em média um ano e meio, Elis analisa pouco mais de 80 mil em 15 dias. Para o TJPE.


RADAR

O intuito deste robô é fornecer recursos para auxiliar casos na primeira instância, apresentando casos similares que já estejam pré-definidos. Para o TJMG.


VICTOR

Foi criado para separar e classificar peças processuais, além de sugerir passos do processo para o magistrado. Para o STF.


SINAPSES

Com um banco de dados de 44 mil despachos, sentenças e julgamentos, a ferramenta seleciona decisões anteriores sobre o mesmo tema. Para o TJRO.

Referências

CHEN, Daniel L. Machine Learning and the Rule of Law

DAVIS, Anthony E. The Future of Law Firms (and Lawyers) in the Age of Artificial Intelligence.

FENWICK, M. KAAL, W, VERMEULEN, Erik. Legal Education in a Digital Age. Why Coding for Lawyers Matters. Tilec Discussion Paper. Tilburg: Tilburg University, 2018.

KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: duas formas de pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

MURO, Mark; WHITON, Jacob; MAXIM, Robert. What Jobs are Affected by AI?

NEUMANN, John von. The computer and the brain. 3rd ed. New Haven: Yale University Press, 2012.

NOVAES, R. V.; MAGALHÃES GOMES, M. F.; VALENTINI, R. S. ,L.; Desenvolvimento tecnológico e o futuro da atividade jurídica. In: PARENTONI, L. (Coord.), GONTIJO, B. M.; SOUZA LIMA, H. C. (Orgs.). Direito, Tecnologia e Inovação. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018. p. 989-1007.

SBICCA, Adriana. Heurísticas no estudo das decisões econômicas: contribuições de Herbert Simon, Daniel Kahneman e Amos Tversky. Estud. Econ., São Paulo, vol.44, n.3, p.579-603, jul.-set. 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-41612014000300006. Acessado em 01/10/2020.

VEITH, Christian et al. How legal technology will change the business of Law. Hamburg: Bucerius Law School, 2016.

[1] A título de exemplo: ● Efeito “Ancoragem”: tendência de usar como referência o primeiro valor proposto, independentemente da sua relação com o objeto da análise. Acontece quando as pessoas consideram um valor particular para uma quantidade desconhecida antes de estimar essa quantidade ● Efeito do enquadramento: assim como no caso do efeito da ancoragem, a resposta a determinados questionamentos depende consideravelmente da formulação da questão. ● Efeito da disponibilidade de ocorrências: na medida em que exemplos de determinadas classes serão recuperadas da memória e, se a recuperação for fácil e fluente, a categoria será avaliada como abrangente. Trata-se, assim, de processo de julgar frequência segundo a facilidade com que as ocorrências vêm à mente.

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