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Cientista chinês afirma ter criado os primeiros bebês geneticamente modificados



Neste último domingo (25/11/18), o MIT Techonology Review reportou que o emprego da técnica de edição genética CRISPR (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats) vem sendo testado por um time da Southern University of Science and Technology, em Shenzhen, que vem recrutando casais em um esforço para criar os primeiros bebês geneticamente modificados, com base neste e neste documentos.

O plano é eliminar o gene conhecido como CCR5 que, em caso de sucesso, poderá criar seres humanos resistentes ao HIV, varíola e cólera. Segundo o MIT, a referida documentação aponta que o plano consiste em alterar os embriões antes de serem transferidos aos úteros.

Contatado, o cientista responsável pelo esforço em equipe, He Jiankui, não prestou comentários. Contudo, segundo a Associated Press, He informou a tentativa de alteração genética em sete casais, sendo que um deles resultou em uma gravidez bem sucedida.

Tratam-se dos gêmeos Lulu e Nana, os primeiros seres humanos geneticamente modificados, segundo alega He no vídeo promocional do seu projeto. Ainda não há confirmação independente do sucesso da operação, tampouco os resultados foram publicados.

Segundo o MIT, a prática de edição genética é amplamente proibida pela Europa, Estados Unidos e mesmo na própria China, e o próprio cientista He Jiankui encontra-se em investigação, vez que, já no próprio dia 25, o Conselho de Experts de Ética Médica da cidade de Shenzen iniciaram sua inquisição a respeito da pesquisa.

Embora He tenha afirmado que o Comitê de Ética do Hospital HarMoniCare para mulheres e crianças de Shenzen, o Conselho de Experts publicou entendimento de que o Hospital HarMoniCare não seguiu os requisitos apropriados para tanto.

CRISPR

Anteriormente, pesquisadores da Universidade de Saúde e Ciências do Oregon utilizaram, com êxito, a técnica de edição genética CRISPR em embriões humanos para reparar a mutação de um gene. O estudo tem por intenção viabilizar a correção de defeitos congênitos em momento anterior ao nascimento por meio da remoção da variante genética geradora da doença hereditária, trata-se do gene conhecido por MYBPC3 (DOMÍNGUEZ, 2017).

A possível aplicação da técnica abarcaria várias desordens hereditárias, como é o caso da cardiomiopatia hipertrófica (morte súbita - doença analisada neste teste inicial), câncer de mama e de ovário, doenças mentais, fibrose cística, hemofilia, dentre outras doenças. Nesse contexto, a técnica, estima-se, poderia alcançar até 10.000 doenças causadas pela cópia anômala2 do referido gene. (DOMÍNGUEZ, 2017).

Até então, vem sendo empregada a utilização do diagnóstico do pré-implantacional (PGD), técnica que possibilita que casais portadores da mutação genética venham ter filhos saudáveis por intermédio da seleção de embriões após a fertilização in vitro, viabilizando a implantação no útero dos embriões sem anomalias. Comparativamente, a técnica CRISPR já apresenta uma taxa de sucesso de 70%, batendo os 50% do diagnóstico pré-implancational. (DOMÍNGUEZ, 2017)

Em 2012, a empresa uniQure, localizada em Amsterdam, desenvolveu um procedimento de terapia genética, conhecido por ser o primeiro medicamento do tipo, para o tratamento de uma condição genética conhecida como deficiência da lipoproteína lipase. O custo de uma única dose do tratamento: 1.4 milhão de dólares. O medicamento se provou uma falha comercial e deixou o mercado em 2017. (MCCONAGHIE, 2017)

Direito

No Brasil, vigora a lei 11.105/05, que trata – inclusive – da pesquisa, cultivo, produção, manipulação e comercialização dos OGM, Organismos Geneticamente modificados, e requer prévia autorização da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio.

Por força do artigo 6º da referida lei, proíbe-se a engenharia genética em células humanas germinais, assim como zigotos e embriões. Tal proibição está diretamente ligada à exceção do artigo 4º, parágrafo II, que exclui a modificação de células somáticas do escopo proibitivo desta lei. As células somáticas, ao contrário das células germinativas, são incapazes de transmitir as características genéticas para as próximas gerações por não estarem envolvidas no processo de reprodução. No caso, portanto, os gêmeos modificados, caso seja comprovada a veracidade da modificação, estão aptos a reproduzirem descendentes com as mesmas características, trazendo ao mundo consequências nunca antes experimentadas pela humanidade.

Hoje, no dia 26/11/18, Feng Zhang, um dos inventores da técnica CRISPR, suplicou por uma moratória global ao uso da técnica para a edição de bebês, constatando que todo o segredo e obscuridade são não só preocupantes, como alegando que, com base no que se sabe da técnica até então, os potenciais benefícios em decorrência do seu uso não suplantam os eventuais riscos envolvidos.

Juridicamente falando, não resta dúvida de que se trata de prática proibida em solo brasileiro. Contudo, havendo a possibilidade de se realizar uma alteração genética transmissível, com ela vem a responsabilidade ética da escolha entre realizá-la ou não. Mas como escreve Michael Sandell (2015, p.35): “Em todos esses casos, persiste algo de moralmente inquientante. O problema não reside somente nos meios, mas também nos fins almejados. É comum dizer que o melhoramente genético, a clonagem humana e a engenharia genética ameaçam a dignidade humana. Isso é verdade. O desafio, porém, é identificar como essas práticas reduzem a nossa humanidade – ou seja, quais aspectos da liberdade humana ou do florescimento humano se veem ameaçados”.

Fontes

COUTO, Débora Soares; Caldas, Rômulo. Humanidade Alterada: edição genética sob a perspectiva financeira do Estado e o aspecto da eugenia. 2018. Disponível em https://www.conpedi.org.br/publicacoes/6rie284y/3j3zda80/oe3PAYvy6HOwG3pj.pdf. Acesso em 26 nov. 2018.

DOMÍNGUEZ, Nuno. Cientistas eliminam pela primeira vez gene da morte súbita em embriões humanos: Pesquisadores conseguem corrigir doenças hereditárias severas usando CRISPR, técnica de edição genética. 2 ago. 2017. Disponível em:. Acesso em: 26 nov. 2018.

MCCONAGHIE, Andrew. Glybera, the most expensive drug in the world, to be withdrawn after commercial flop. 2017. Disponível em https://pharmaphorum.com/news/glybera-expensive-drug-world-withdrawn-commercial-flop/. Acesso em 26 nov. 2018.

SANDEL Michael J. Contra a perfeição: ética na era de engenharia genética. Rio de Janeiro: Civilização Brasielira 2015.


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